quinta-feira, julho 26, 2007

A Essência da Vida

(cronicando de novo..)

A Essência da Vida

"É impressionante o que se descobre por acaso. Pois foi assim que, hoje, em um momento puramente aleatório, fiz a maior descoberta dos últimos tempos. E seguro de que estou certo, passo a relatar minha experiência. Importante notar o quanto coisas tão banais podem ter tremendo significado, mais uma forma de escrever um clichê destacando as coisas simples, mas os clichês existem por um motivo, certo?
Certo. Minha história começa no momento em que cruzei a porta de casa e caminhei pelo corredor que, gentilmente com seu sensor de movimento, se iluminou para mostrar o caminho que viria a percorrer até minha descoberta. Apertei o botão do elevador, fiquei esperando poucos minutos até o mesmo chegar, entrei, apertei o botão do estacionamento. Alguns segundos depois, chegando ao meu destino, as portas se abriram e, ali, disposta de forma tão óbvia estava a essência da vida, meus amigos.
Quando coloquei o pé para fora, não tive como passar pois três vizinhos estavam em frente à porta do elevador, bloqueando minha passagem, esperando ansiosamente pra entrar. Tentei achar um espaço, nada. Então tudo ficou claro: a essência da vida é entrar no elevador. Sim, amigos. Aos poucos fui confirmando a expectativa, como quando pedi licença e um dos três me respondeu, telepaticamente, devo observar:

- Licença? Não tente me enganar, Guardião do Elevador, eu vou entrar!

Essa situação já havia se repetido no hall do condomínio várias vezes, mas nunca havia percebido tamanha importância. Decidido a descobrir mais sobre o assunto, desisti de ir ao cinema e comecei a pensar sobre o assunto. Divido com vocês o pouco de conhecimento que obtive pesquisando em campo.

Achei que talvez nem todos os elevadores fossem o nosso objetivo, já que existem tantos, então saí à procura do certo. Em minha busca, passei por diversos elevadores, pequenos, grandes, com espelho, sem espelho, com choro de criança, sem choro de criança. Alguns eram habitados por rapazes que se colocavam sentados em frente aos números dos andares. O que eles guardavam? Talvez uma combinação secreta relevaria mais coisas. Pensei em sequestrar um desses elevadores, mas não era hora de ficar paranóico. Então, depois de duas horas observando um, nosso suspeito Guardião foi ao banheiro e pude entrar no elevador e tentar diversas senhas. Em vão. Saí um pouco abalado, mas o experimento científico não é feito apenas de êxito, companheiros, por isso continuei.

E então, no número 87 de minha busca - sim, 87, só pode ser um sinal, a soma de seus dígitos é 15, 15! -, achei o que pode ser "O Elevador Um" - o nome que escolhi para a essência. Parecia ser como qualquer outro, mas há de se observar, amigos, que a vida esconde mistérios onde não pensamos em procurar. Quando as portas se abriram, encontrei o motivo de minha suspeita. Talvez por um erro de itinerário ou de vigilância, ali dentro estava um rapaz uniformizado, lia-se "Atlas" em seu uniforme. "Atlas", desbravadores! Só poderia ser esse. E não é só isso, a parte de cima estava aberta e ele sentado nela só com as pernas à mostra, talvez ajeitando o dispositivo de segurança. Tanto faz, fui direto ao ponto:

- Então é você, né?

E ele respondeu, fingindo não saber de nada:

- Quem você 'tá procurando?
- Você não me engana, Guardião, eu posso ver o Portal da Vida.
- Acho que você tá me confundindo com o seu Zé da portaria, o guardinha, ele está logo ali.
- Não tente desconversar, o Portal está aberto diante dos meus olhos.
- Você quer dizer o teto do elevador?
- Eufemismos..
- Do que você 'tá falando?

Eu estava há muito tempo em minha busca pra aturar isso, puxei o Guardião pelas pernas, joguei no chão e comecei a interrogar como se tudo dependesse disso. Mas ele, como foi treinado, insistia que não sabia do que eu estava falando, me chamou de louco. Louco? Faça-me o favor, apenas um homem fraco em mente ficaria louco com
tanto conhecimento aos seus pés, e esse não é o meu caso, tenha certeza disso.

Mas, com minha ânsia por confirmar o que já sabia, não pensei no esquema de proteção ao Portal. Alguns minutos depois, homens disfarçados de policiais chegaram e me levaram, o que só confirmou ainda mais minhas suspeitas.

Eles perguntaram o que aconteceu, como se não soubessem! Após contar para entrar no jogo, ficaram um tanto surpresos, conversaram com um homem de capa branca e me colocaram em uma sala com esse mesmo homem, o qual chamavam de "Doutor". Quem seria esse tal Doutor? Provavelmente alguém do mais alto escalão do Portal.

E não pára por aqui, amigos. Esse Doutor não tentou me enganar por muito tempo.

- O que aconteceu, meu rapaz?
- Não esperava essa sustentação da farsa de você, Doutor.
- Você está falando sobre o Portal?
- Sim.

Foi quando ele deixou claro que estava na operação Controle de Danos:

- Conte-me o que você sabe.
- ...e, assim, finalmente cheguei ao "Elevador Um". Consegui desvendar a Essência da Vida, Doutor, meu destino,

e o de tantos outros nesse mundo.
- Entendo.
- Não vai mais tentar fugir da conversa?
- Não, está tudo bem claro já.

Pouco depois, fui levado por outros homens vestidos de branco. Tentei resistir, mas injetaram em mim o "Soro do Esquecimento", minha vista escureceu.

Acordei aqui, nesse quarto com paredes cobertas por espumas. Mal sabem eles que o Soro apenas apagou alguns minutos de minha memória. Acredito que estão se perguntando como consegui escrever essa carta. Bem, mentalmente montei a agenda do local. Uma vez por dia, sou levado para uma sala maior com vários outros Missionários - decidi nos chamar assim -, esses tiveram suas lembranças apagadas, de fato, pelo Soro do Esquecimento e, no lugar, outras foram implantadas. Como eu sei se só passo dez minutos com eles? Consegui esse papel e caneta com um ex-Missionário que dizia ser um ornitorrinco. Sim, eles são cruéis, amigo. Por isso, temo por minha vida se descobrirem que seu remédio não fez efeito em mim.

Elaborei um ambicioso plano durante semanas com alguns dos ex-Missionários para colocar essa carta fora da Prisão da Vida e ,assim, relevar a verdade para o mundo. Foi difícil explicar para meus ajudantes o que fazer, aparentemente, o Soro retarda um pouco o raciocínio, algum tipo de efeito colateral.

Mas, se Ornitorrinco, Napoleão e Chapolim fizeram tudo corretamente, você acabou de descobrir a Essência da Vida. A Missão escolheu você, nobre transeunte, o mais novo Missionário, e não posso contrariá-la, por isso, deixo em suas mãos o nosso destino. Cabe a você saber o que fazer com tamanha verdade adquirida.

Boa sorte. Que a Essência lhe acompanhe.

Assinado: Missionário X"

...

Então Marcos riu, amassou o papel que encontrara no chão e seguiu para o seu trabalho em uma empresa chamada "Atlas". "Atlas", amigos..

sábado, julho 14, 2007

Um pequeno discurso sobre o tempo

(que fique registrado que já cansei)

Um pequeno discurso sobre o tempo

Faz tempo que eu não escrevo um texto assim, longe da poesia, um diálogo honesto com as linhas em branco. Essas linhas e eu nos entendemos, mesmo que ultimamente tenhamos conversado por desculpas, vez ou outra por promessas. Difícil não repetir as mesmas desculpas, mais difícil ainda se desculpar por uma promessa não cumprida. E é nessa exata última linha que começo minha história.

Foi aqui, nessa mesma quarta-feira de algum mês atrás, talvez terça-feira, mas esse mesmo refrão de uma quarta - ou terça - tocava, do tipo que só toca nesse dia. Típico. Faça-se notar que odeio dias assim e todas suas reflexões, minhas reflexões. Rejeito qualquer sugestão de sentimento, mas vai saber o quanto sou fraco perto de mim.

Então tudo toma conta, e onde me encontrava, encontram-se tantos que nem me reconheço entre os personagens. O que nega, o que vez ou outra aceita, o que finge que não sabe, o que é racional, o que há muito perdeu a razão, o que escreve, o que apaga o que acabou de escrever e o que acabou de colocar esse ponto. E ai de quem tire. E de quem coloque mais um.. Opa, coloquei. Por isso sou tempestade e calmaria pra mim. Sou. É. Ah, se é.

Mas voltando, a unanimidade entre todos meus eus é o fato de que o tempo parou naquele refrão. E isso faz com que a teoria de que o tempo não é uma linha, mas um espaço plano, onde não necessariamente se anda pra frente e pra trás, parece ter sua razão.

Digo com firmeza que cansei de andar para os lados. Cansei de você, tempo. Cansei de fazer promessas pela última vez mais uma vez. De saber que o eu de agora não pode controlar o eu da semana que vem, esse eu que vai insistir em repetir erros, em andar na diagonal. Esse eu que depois vai fazer as mesmas perguntas para confirmar velhas respostas que nunca quisera saber tantas outras vezes.

Não consigo nem organizar meu tempo em um texto, já me perdi em assuntos e frases que nem sempre se comunicam com as seguintes.
É essa invencibilidade do tempo que me destrói.
É o certo tique ante cada taque, é o caminho perfeito, é o não-atraso, a falta de acaso.
É o meu apressar o passo pra acompanhar cada espaço.
É o escasso que nunca acaba, é o pouco que sobra quando ainda há o tanto que resta.
É o amanhã que se pinta de hoje, o hoje que já dorme ontem, é o ontem que não pensa mais em ser hoje.
Mas acima de tudo isso, é o transformar da minha promessa de não fazer disso poesia em mais uma pela última vez outra vez.

No fim, é essa mensagem que parece tão nova, mas que soa tão repetida.
É o meu defeito, e ainda assim o que nunca deixo de fazer direito.

Há de se adorar essa certeza do meu engano. Ah, se há.